Manuel Bandeira

Belo Belo
Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero.
Tenho o fogo de constelações extintas há milênios.
E o risco brevíssimo - que foi? passou - de tantas estrelas cadentes.
A aurora apaga-se,
E eu guardo as mais puras lágrimas da aurora.
O dia vem, e dia adentro
Continuo a possuir o segredo grande da noite.
Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero.
Não quero o êxtase nem os tormentos.
Não quero o que a terra só dá com trabalho.
As dádivas dos anjos são inaproveitáveis:
Os anjos não compreendem os homens.
Não quero amar, Não quero ser amado.
Não quero combater, Não quero ser soldado.
- Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples.

Belo Belo II
Belo belo minha bela
Tenho tudo que não quero
Não tenho nada que quero
Não quero óculos nem tosse
Nem obrigação de voto
Quero quero
Quero a solidão dos píncaros
A água da fonte escondida
A rosa que floresceu Sobre a escarpa inacessível
A luz da primeira estrela
Piscando no lusco-fusco
Quero quero Quero dar a volta ao mundo
Só num navio de vela Quero rever Pernambuco
Quero ver Bagdá e Cusco Quero quero
Quero o moreno de Estela
Quero a brancura de Elisa Quero a saliva de Bela
Quero as sardas de Adalgisa
Quero quero tanta coisa
Belo belo
Mas basta de lero-lero
Vida noves fora zero.

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